Para Kat Barrigão o futuro do longboard feminino está em boas mãos mas há que lutar por ele
A propósito do Mês da Mulher, conversámos com a 5x campeã nacional de longboard, Kathleen Barrigão.
A propósito do Mês da Mulher, a Surftotal conversou com algumas mulheres que têm lugar de destaque no panorama do surf nacional. Hoje, no Dia da Mulher, demos voz a uma das principais caras do surf feminino de longboard português, Kat Barrigão para perceber se existem diferenças quer em cultura, quer género, quer em investimento entre modalidades.
A 5x campeã nacional de longboard, Kathleen Barrigão, dança em cima de uma prancha de surf. Os avanços e os recuos que dá com os pés enquanto desliza nas ondas podem constituir uma analogia ao mundo do surf. Se por um lado, o “poder da surfista feminina moderna tem tomado as rédeas da luta contra o machismo no desporto”, por outro lado, segundo a atleta, corre-se o risco de deixar de haver atletas e longboarders profissionais.
Embora o surf seja a sua vida, não consegue viver através dele. Não pela falta de aptidão mas por outros motivos que a ultrapassam.
Ainda assim, aquilo que está ao seu alcance, Kat toca com o seu cunho pessoal. Fez nascer, juntamente com o longboarder João Dantas, a comunidade “The Longboard Academy” e além de ensinar a técnica de longboard, ensina simultâneamente que o surf é um desporto de todos e para todos, independente do tamanho da prancha ou género.
P: Dedicas-te sobretudo ao longboard mas também surfas de shortboard, quais são as principais diferenças que vês entre ambos em termos de cultura e lifestyle?
R: Acho que ambos tem a mesma base em termos de cultura. Um evoluiu do outro e nunca nos podemos esquecer das nossas raízes. Eu sempre adorei surfar em pranchas diferentes. Acredito que todos os surfistas devem experimentar todos os estilos e pranchas de surf para se tornarem familiarizados com o que é o surf.
“Sempre quis lutar pela rebeldia duma surfista num mundo dominado por homens”
P: E quanto ao longboard feminino como é que a comunidade do longboard encara a sua presença na água?
R: Hoje em dia está tudo muito diferente. Temos cada vez mais mulheres dentro de água e o poder da surfista feminina moderna tem tomado as rédeas da luta contra o machismo no desporto. No longboard, eu e o João Dantas criámos a nossa comunidade, The Longboard Academy, onde a maioria das nossas praticantes são mulheres! O nosso objetivo é ensinar longboard, passar a cultura mas também puxar mais pelas mulheres (a nível competitivo ou não)
P: Há uma tantas mulheres como homens a surfar de longboard?
R: Cada vez mais! Acredito que qualquer dia as águas vão ser dominadas por mulheres a fazer longboard!
“Não há mais investimento no surf feminino a não ser que tenham ‘uma imagem’ bonita”
Campeonato Nacional de Longboard feminino, na Costa da Caparica, onde se sagrou campeã nacional em 2021 | Fotografia tirada na final feminina por @jillianjaclyn
P: Seja verdade ou não, argumenta-se que no shortboard as diferenças anatómicas mudam o estilo de surf feminino e masculino, consideras que no longboard essa percepção existe?
R: Na minha opinião existe menos. Como o longboard envolve tanto a técnica, quanto ao estilo, em termos das diferenças anatómicas, acho que se pode dizer que os homens tornam-se mais elegantes a fazer longboard. Pois é uma dança entre técnica e leitura da onda.
P: Tens o apoio da marca portuguesa Janga, de que forma é que se relacionam com o surf feminino? Dão tanta importância como ao masculino?
R: A Janga foi umas das primeiras marcas a acreditarem em mim e hoje em dia sou muito agradecida por terem-no feito há cerca de 7 anos. Eu sempre acreditei em transmitir uma imagem no surf/longboard português da “não tão típica” miúda do surf. Como sempre competi com os homens/rapazes e fui campeã nacional de longboard sub-18, sempre quis lutar pela rebeldia duma surfista num mundo dominado por homens e a Janga sempre ajudou a fazer isso. Acredito muito na marca pois eles acreditam em quem faz parte dela. Janga Família.
“A mensagem que o Joel Tudor está a passar é crua e pode ser vista como exagerada mas não é”
P: Recentemente Joel Tudor levantou a questão de as mulheres do longboard arrecadarem mais engagement em comparação com às mulheres do shotboard e falou da grande disparidade de salários. Concordas com as suas afirmações e sentes esta marginalização? Se sim, a que é que achas que isto se deve?
R: Vou ser muito sincera. A luta pelos direitos dos longboarders e das surfistas femininas tem sido uma batalha entre culturas, desporto, o mundo mediático e o que vende mais. Porque a realidade é que o longboard tem crescido muito a nível nacional e mundial. A mensagem que o Joel Tudor está a passar é crua e pode ser vista como exagerada mas não é, há uma razão pela qual eu e muitas mulheres não vivemos disto. Há uma ou até várias razões pela qual eu e os meus amigos competimos no mundial mas não conseguimos fazer disto as nossa vida, evoluir e ir mais longe. Não há investimento no longboard! Não há mais investimento no surf feminino a não ser que tenham “ uma imagem” bonita. Se não tomarmos conta da nossa sociedade e se as marcas de surf não se chegarem à frente para se aperceberem que transparecem mensagens completamente opostas às que vendem no Instagram, vão deixar de haver atletas e longboards profissionais!
Após sagrar-se campeã nacional em 2021 na Costa da Caparica
Por Catarina Brazão