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O MODELO COMPETITIVO DO SURF PORTUGUÊS É EFICAZ? ENRIQUE LANZANO RESPONDE
Porque razão há 20 anos atrás Portugal era a maior potência do surf Europeu? "Tendo apenas França como grande adversário"
Portugal era há cerca de 20 anos atrás a par da França a maior potência Europeia de Surf, mas durante estes 20 anos a situação tem-se vindo a modificar e a realidade dos dias de hoje é bem diferente.
A Surftotal lança com esta entrevista um debate que tem como objetivo dar a perceber a realidade e o que eventualmente se poderá modificar, por forma a que a formação dos atletas Portugueses seja mais eficaz e coloque Portugal num rumo assertivo e de resultados competitivos ainda mais positivos.
A chamada cultura de surf será importante nas bases do surf Português? Porque será que há poucos surfistas Portugueses a alcançar bons resultados nas provas Europeias de do circuito QS? Será que o modelo competitivo Português é eficaz? Será que temos uma overdose de competições nacionais? estas e outras questões foram colocadas a diversas pessoas que de uma forma ou outra são intervenientes na atualidade do Surf Português.
Enrique Kike Lanzano, treinador profissional, fundador da Academia Profissional Surf e da More than Surfing, e atualmente o Kike Surf Coach, dá a sua opinião à Surftotal sobre a atual situação do Surf competitivo Português:
Surftotal: Conta nos em primeiro lugar como corre o teu projeto?
Henrike Lanzano:O meu projecto Kike Surf Coach esta correr muito bem, é um projecto que tem como principal objectivo ajudar as pessoas evoluir no seu surf, sejam elas aspirante a surfistas profissionais ou apenas praticantes que queiram melhorar a sua performance, quer nas ondas portuguesas ou internacionais. O projecto Lombos Praia que lidero como Diretor Técnico esta começar a desenvolver alguns jovens atletas, o futuro é promissor.
Quem treinas e quais os objetivos?
Atualmente estou treinar o Luís Perloiro na vertente Surf Alta Competição, um trabalho que estamos a desenvolver juntos há 10 anos e que tem como principal objectivo a entrada ao CT e a participação nos Jogos Olímpicos.
Na vertente Surf Performance Integrado estou a trabalhar com o Salvador Couto, um projeto que vai ao encontro das aspirações do Salvador, conciliar os estudos universitários com o Surf. Treino também três grupos de surfistas praticantes assíduos de diferentes idades de forma semanal, estes grupos têm como principal objetivo a sua evolução técnica e assessoria sobre que tipo de material utilizar, destinos dentro e fora do país para viajar para fazer surf. E por último através do Clube tenho estado a trabalhar com jovens como o Francisco Mittermayer, Salvador Vala, Santiago Graça e Gabriela Dinis, e outros dos escalões mais iniciados, onde o objetivo é poder aplicar o Programa de Desenvolvimento a Longo Prazo que implementei na estrutura do Clube.
"Considero que o surf competitivo chegou
ao patamar da alta competição"
Estes últimos dez anos consideras que o surf competitivo chegou a que patamar? Porquê?
Considero que o surf competitivo chegou ao patamar da alta competição. Nesta última década os atletas cada vez mais preparam melhor a sua época desportiva contam com uma boa periodização, melhor alimentação, estilo de vida mais saudável, treinadores cada vez mais especializados, mais formados e estruturados, estamos assistir a transformação do surfista bom que passava heats ao atleta de surf de alta competição que prepara cada evento, cada heat e cada manobra para ganhar. Por outras palavras mais profissional.
Se compararmos a geração competitiva de há 20 anos atrás percebemos que a nível europeu o nosso nível competitivo de surf não evoluiu, porque consideras isto estar a acontecer?
Apesar de nestes últimos 20 anos haver mais e melhores condições (escolas de surf/ treinadores) para a formação de jovens atletas tal não se tem refletido na qualidade do surf. A principal razão é cultural, o acompanhamento aos jovens é demasiado quer a nível familiar quer a nível Treinador, num desporto como o surf onde a tomada de decisão é fundamental, andamos todos a dizer as crianças o que fazer, como fazer a toda hora. Há 20 anos eram menos representantes em competições europeias, mas havia vitórias, havia presenças assíduas em fases finais, hoje apesar de o número ter mais do que triplicado nas competições europeias esse aumento não se reflete em resultados, pelo menos por enquanto.
O que é necessário para darmos a volta e passarmos de novo para a frente? Ou não se podem colocar as coisas nestes termos?
A mudança tem que ser global, por exemplo a WSL estar a organizar eventos em praticamente todas as suas categorias (CT masculino, CT Feminino, QS 10.000, QS 6.000, QS 3.000, ondas grandes e Pro-Junior) em Portugal o que é uma excelente forma de consciencialização sobre o nosso enorme potencial, ou seja, os jovens estão a ser diretamente influenciados, que melhor impacte na vida de um aspirante a profissional do que ter contacto com os seus ídolos?! Falta-nos criar essa consciência, é responsabilidade dos treinadores incutir os valores certos, é responsabilidade dos pais assistir com os seus filhos a este tipo de eventos e lhes transmitir a paixão, estimular e promover a cultura do surf sem preconceitos. A formação de profissionais deveria ser obrigatória para todos aqueles que intervenham na formação de jovens. Entre outros aspetos, destaco estes como principais.
Somos o país com maior numero de provas de surf/ano
para menores de 18 anos do mundo,
pergunto eu para quê?
Vamos agora aos eventos competitivos em Portugal. Ao nosso modelo comparado com as maiores potências do surf, Austrália, Havaí, Brasil ,etc. Podemos considerar ter um dos mais ocupados calendários competitivos a nível mundial. Como comentas esta afirmação?
É uma afirmação da qual não me identifico de todo. Somos o país com maior numero de provas/ano para menores de 18 anos do mundo, pergunto eu para quê? para ensinar aos miúdos que é mais importante o resultado de uma prova do que o resultado da prestação (em fases de formação) as crianças não sabem fazer manobras e vão aos campeonatos para ganhar. Claramente neste aspeto temos muito aprender das potências do surf como Austrália, Brasil, Havaí e França onde não existe sequer o “titulo” de campeão nacional sub-12! apenas para sub-14, sub-16 e sub-18 e open claro. Já a Liga Nacional de Surf (Liga MEO) é exemplar a nível internacional, na minha opinião, excelente estrutura, organização, prize money live broadcast e muito bom nível de surf, de fazer inveja as potências mundiais.
Que modelo competitivo julgas que se adaptaria melhor para Portugal?
O modelo que atribui o titulo de campeão nacional open individual (Liga MEO) é excelente, não mudava nada. Competições para menores de 18 anos individuais acredito que o melhor formato seja aquele que dê maior protagonismo aos clubes, ou seja, devia haver uma só prova para cada categoria Sub-14, Sub-16 e Sub-18 (excluía os Sub-12) que defina o título de campeão nacional. O apuramento para esta prova única devia ser feito pelos clubes, através de circuitos intersócios (apenas para sócios federados) e daí o apuramento para o evento principal, cada clube apura os seus representantes. Este formato é o que irá acrescentar valor ao surf, ao desenvolvimento de atletas, aos clubes e ao desportivismo. Por fim, a Taça de Portugal tem um formato obsoleto, criado em 1994 para satisfazer necessidades dessa época, atualmente não se justifica juntar modalidades, até o próprio formato dos ISA World Surfing Games ( que inspirou o formato original da Taça) deixou de juntar as modalidades, as competições deveriam servir para a evolução individual e em conjunto dos atletas e clubes, tomemos como exemplo o equivalente a nossa Taça na Austrália, é o único evento fora da WSL que os surfistas do World Tour estão autorizados em participar, e todos se orgulham em representar o seu clube local. Por último, falta apenas um circuito nacional para ondas grandes, temos ondas e surfistas para isso.
"A cultura de praia (que influencia diretamente a cultura do surf)
está pouco desenvolvida"
Como consideras estar a cultura de surf entre a comunidade de surf portuguesa?
A nível nacional existem muitos simpatizantes da modalidade e do “lifestyle” mas na verdade a cultura é recente e são poucos os verdadeiros promotores da mesma. O Pirrayt disse-me no outro dia, - “eu sou um dos primeiros surfistas aqui em Portugal, ainda agora vim da Austrália, onde os surfistas da minha idade são terceira geração de surfistas” isto evidencia em termos comparativos a idade da nossa cultura. Já a cultura de praia (que influencia diretamente a cultura do surf) esta pouco desenvolvida, desde os nadadores salvadores aos waterman pouco é feito para promover o contacto com a praia. De forma generalista a praia é para ir no verão. Os clubes de surf com sede na praia poderiam assumir maior protagonismo em fomentar o crescimento da cultura de praia ao longo de todo o ano, com outras atividades além do surf tais como a remada, bodysurf entre outros. Portugal esta no seu caminho ao seu ritmo a dar forma a sua cultura de surf.
Qual o próximo português a integrar o world tour?
O talento apenas não chega, por isso na minha opinião o próximo Português a entrar no World Tour será aquele que trabalhe muito, seja persistente, resiliente, ambicioso, profissional e com uma enorme capacidade de sacrifício e superação.