Discussão pública para projecto de eólicas próximas da costa
Está aberta por 30 dias a discussão pública de um projecto que está a gerar polémica
No dia 28 de Dezembro de 2022, um Grupo de Trabalho interministerial do Governo Português, lançou um relatório sobre os resultados de um projecto piloto de exploração de energia eólica em offshore. Ver proposta aqui.
De acordo com o relatório, em 2019 foi criada e aprovada em Resolução de Conselho de Ministros - n.º 203-A/2019, de 30 de Dezembro – a delimitação de uma zona piloto com cerca de 47km2 no oceano, ao largo de Viana do Castelo, para a implementação de projectos-piloto de tecnologia eólica.
Assim, instalou-se naquele local primeiro parque eólico flutuante da Europa continental, chamado projecto WindFloat Atlantic.
“Foi georreferenciado um conjunto de áreas onde a energia eólica será fonte de geração da energia elétrica, proveniente de eletrogeradores montados sob estruturas flutuantes e ancoradas no fundo do mar ou em estruturas fixas no fundo do mar onde tal seja possível, complementado por eletrogeradores atuados pela energia das ondas.”
O objectivo deste relatório é o estudar quais as melhores áreas, e analisar o sucesso de um projecto deste tipo tendo em conta as características do mar e do clima português.
“Assim, tendo em conta os rácios de potência por km2 aceites pela indústria, são propostas áreas com dimensões adequadas para projetos comerciais de energia renovável no EMN (Espaço Marítimo Nacional) ao largo de Viana do Castelo (ampliando a área já existente), ao largo de Leixões, da Figueira da Foz, da Ericeira e Sintra-Cascais, e de Sines, as quais, no seu conjunto, permitirão atingir a prazo a meta de potência de 10 GW. São também definidos, de forma muito preliminar, as áreas dos pontos de injeção da energia na rede nacional ao longo da costa”.
O relatório aponta também que existe enorme procura para investimento neste tipo de tecnologia para produção de energia e exploração comercial.
“Este cenário determinou que a Direção-Geral de Recursos Naturais, Segurança e Serviços Marítimos, enquanto entidade responsável pelo ordenamento do EMN (Espaço Marítimo Nacional), tomasse as diligências necessárias, junto do membro do Governo responsável pela área do mar, para a elaboração de um Plano de Afetação de Energias Renováveis (PAER), de iniciativa pública. É, assim, publicado o Despacho n.º 12020/2021, de 7 de dezembro, no qual são estabelecidas as regras de funcionamento da CC (Comissão Consultiva do Plano de Afetação) que apoia e acompanha o desenvolvimento do referido plano de afetação visando a integração no PSOEM (Plano de Situação do Ordenamento do Espaço Marítimo Nacional) de áreas potenciais para energias renováveis offshore comerciais.”
Mapa dos locais propostos, para o território nacional.
Muito embora estes projectos sejam de enorme importância para a aposta das energias renováveis, e para o processo de descarbonizarão na produção energética, os mesmos não estão isentos de problemas, sobretudo problemas que podem vir a afectar a qualidade das praias e do surf. Gonçalo Pina, surfista, organizador de eventos da wsl, dono da escola Greencoast Surfschool , foi quem nos chamou a atenção para o facto de o projecto chegar agora para discussão pública nos próximos 30 dias.
“O meu maior receio, é que se replique aquilo aconteceu aqui no norte, que foi o aumento do paredão de leixões, o braço de mar aqui no cabedelo, do Douro, que reteve as areias todas, a reposição das areias que temos aqui nas nossas praias, vinha toda do Douro, e havendo esse braço de mar, deixa de haver essa reposição natural de areias. Maceda por exemplo perdeu nestes últimos anos à volta de 1km de praia.”
De facto de acordo com o relatório, é considerado como um factor limitante a distância à linha da costa, uma vez que proximidade à costa tem interferência com os usos comuns do espaço marítimo. No entanto não são analisados nem especificados, os problemas em termos de impacte ambiental para os fundos e transporte de areias, bem como afectação das ondas. Ao mesmo tempo, e apesar de se reconhecer como um factor limitante, o mesmo é claramente ultrapassado pela proposta, ao admitirem-se distâncias muito próximas da costa, sobretudo na zona de Matosinhos (a 1,86 milhas náuticas), e na zona de Sines, mesmo em frente à costa.
“Aqui na zona de Matosinhos, vamos ter ventoinhas muito perto da costa, a cerca de 1km da costa. O que foi feito em países como Dinamarca e Estados Unidos, é que está sempre longe da costa, assim da costa não conseguimos visualizar as ventoinhas.” – Afirma Gonçalo Pina.
Mapa com a proposta para Matosinhos.
Segundo o documento, o motivo porque se propõem zonas tão próximas deve-se ao facto de “o maior afastamento das áreas espacializadas à linha de costa tem impacto relevante no modelo da rede elétrica a desenvolver, quer offshore, quer onshore, nomeadamente em virtude dos elevados montantes de potência em cada uma das áreas espacializadas e da distância destas à infraestrutura da RNT (Rede Nacional de Transporte Elétrico) existente em terra.”
“Deveria, na minha opinião, ficar tudo, entre 15 a 20km da costa no mínimo, para não haver ruído visual, e também em termos de fundos e em termos de ondas. Não sei o impacte que isto vai ter. Tendo estas estruturas que vão ter que estar acopladas ao fundo, não sei o que vai alterar em termos de ondas, em termos de praias. Não sei porque não foi feito nenhum estudo sobre isso. E penso que era importante, seria fundamental haver um estudo sobre isso, sobretudo devido à proximidade.”
No relatório é também assumido como pressuposto que as áreas seleccionadas deveriam ficar fora das servidões da Conservação da Natureza e Reserva Ecológica Nacional. Contudo imediatamente podemos notar que este pressuposto não é respeitado, tanto na área de Sintra/Cascais, que se sobrepõe a uma área protegida (Zona de Protecção Especial do Cabo Raso PTZPE006), tal como em Espinho, que se encontra na faixa marítima de protecção costeira que integra a Reserva Ecológica Nacional.
“E agora apelava a todos, sobretudo os surfistas, e especialistas na área das energias, analisassem esta questão, e que dessem a sua opinião, porque temos agora 30 dias para estudar e para pensar, neste grande projecto para Portugal. Neste momento estamos com 30 dias de discussão pública, para auscultar toda a população, sobre a implementação deste projecto.” – Apela Gonçalo Pina.
A proposta poderá ser consultada aqui.
E a participação pública deverá ser feita aqui.