Don't Look Up Don't Look Up Netflix segunda-feira, 03 janeiro 2022 17:02

“Não Olhem Para Cima” – Como travar este meteoro

Talvez o paralelo mais óbvio seja entre o meteoro e a crise climática.

 

 

 

Don’t Look Up, um filme da Netflix realizado por Adam McKay que estreou em Dezembro de 2021, é uma tragicomédia que satiriza vários aspectos do nosso comportamento enquanto sociedade. No filme, vemos a reacção da humanidade quando descobre que em seis meses será dizimada por um meteoro, e há vários paralelos que podemos traçar. Na personagem de Meryl Streep, por exemplo, vemos a caricatura de uma figura política que condena a humanidade para não perder votos; Peter Isherwell, interpretado por Mark Rylance, é uma representação clara do 1%, um bilionário desconectado das suas emoções e com total poder sobre indivíduos e instituições graças ao seu dinheiro e ao seu acesso a informação; na resposta ao meteoro podemos ver semelhanças com a pandemia que estamos a viver, e a reacção dos meios de comunicação serve como um comentário sobre a nossa tendência para a espetacularização de todo e qualquer evento, do mais banal ao mais trágico – afinal de contas, a notícia sobre o fim do mundo é dada no mesmo programa que televisa o pedido de casamento de um DJ a uma cantora pop.

 

 

 

 

 

 

 

 

Qual é o nosso meteoro?

 

Talvez o paralelo mais óbvio seja entre o meteoro e a catástrofe climática. Para nós, não é um meteoro a caminho do Planeta Terra, e temos mais do que seis meses para agir, mas a ameaça é real e está no horizonte, não tão distante como muitos gostariam de imaginar. No lugar do meteoro, foi divulgado no ano passado o relatório do IPCC, que consiste em mais de três mil páginas e cinco cenários possíveis, todos eles apontando para o facto de que alguns dos efeitos do aquecimento global vão persistir durante “séculos ou milénios”. As projecções apontam para um aumento da temperatura global em 2,7 graus até 2100, se o ritmo das emissões de gás com efeito de estufa se mantiver, e o nível do mar deve subir, na melhor das hipóteses, em dois metros até 2300. Na costa portuguesa, o aumento do nível do mar poderá fazer-se sentir já em 2030 - mais concretamente, em oito anos, zona do Terreiro do Paço e várias praias da Linha de Cascais poderão já ter sido engolidas pelo mar. 

 

 

Estes dados são concretos, baseados em pesquisas, análises e evidências, tão certos quanto os dados apresentados pelas personagens de Dr. Mindy (Leonardo DiCaprio) e Kate Dibiasky (Jennifer Lawrence) em Don’t Look Up. A resposta da presidente fictícia – “vamos esperar e analisar” – traz à mente as críticas de Greta Thunberg à cimeira COP26 que teve lugar em Glasgow no ano passado. A activista acusou as entidades responsáveis de não fazerem o suficiente, e afirmou que a cimeira “já não é uma conferência sobre o clima, é um festival de lavagem da imagem ‘verde’ para os países do Norte”.

Leonardo DiCaprio, que há muito usa a sua influência para se posicionar em defesa do clima, encontra neste filme uma crítica à “nossa incapacidade de aceitar factos científicos”.  Na sátira, a presidente desvaloriza a informação que recebe, alegando que todos os dias lhe chegam informações sobre a destruição do planeta, e que esta será apenas mais uma. Em seguida, faz uma lista dos tipos de catástrofes de que é notificada, como se fossem acontecimentos insignificantes e inevitáveis, quando na verdade são quase sempre consequência da actividade humana. Também nós ouvimos falar de uma nova catástrofe a cada semana. No ano passado, o planeta foi atingido por ondas de calor, enchentes, incêndios e ciclones um pouco por toda a parte, mostrando que o perigo já está aqui, e que não devemos esperar por um grande evento destruidor, que nos dê uma janela de seis meses para salvar o mundo. Devemos começar a agir agora - na verdade, já devíamos ter começado há muito tempo.

 

 

 

 

 

E agora?

Don’t Look Up é uma tragédia que nos faz rir de nervoso, mas não nos deixa cair no desespero sem uma rede de segurança. Ao satirizar de forma tão brilhante o nosso comportamento, também nos dá dicas quanto ao que podemos fazer, e não fazer, para não acabarmos como as personagens do filme.

O filme aconselha-nos, por exemplo, a desconfiar de figuras como Peter Isherwell, que encaram a possível destruição do mundo como uma oportunidade de fazer mais dinheiro. Alerta também para os perigos da politização da ciência, e chega mesmo a fazer uma autocrítica através da personagem de Riley Bina (Ariana Grande): nem tudo pode ser entretenimento. Há coisas que simplesmente não são divertidas, e a crise climática é uma delas. 

Mas, depois de visto o filme e interiorizada a mensagem, somos convidados a ir um pouco mais longe, e a dar passos concretos para defender o planeta. A equipa do filme juntou-se à organização Count Us In num movimento que propõe acções palpáveis, explicadas neste website. Entre elas, o movimento encoraja o diálogo, a pressão a figuras políticas e a mudança de hábitos alimentares e de deslocação. 

A mensagem - a do filme, a deste movimento, e a nossa - é muito simples: não temos apenas seis meses, mas também não temos a vida toda. E se queremos travar este meteoro, precisamos de agir juntos, e rápido. 

 

 *Texto por Maria Kopke

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