Depois de uma recuperação difícil, Pedro Barros encontra-se bem. Depois de uma recuperação difícil, Pedro Barros encontra-se bem. Foto: Arquivo Pessoal segunda-feira, 27 março 2017 13:53

Carta aberta de João Barros

Após incidente de Pedro Barros, o seu irmão revela mais pormenores e agradece todo o apoio… 

 

N.R.: Em novembro passado, o surfista Pedro Barros esteve envolvido numa queda no pico da Pedra Branca, Ericeira, que o atirou para a cama de um hospital. Na altura temeu-se o pior, mas, o Pedro lutou pela vida e hoje está bem. A carta que se segue foi-nos enviada pelo seu irmão e tem dois objetivos: por um lado, dar a conhecer os momentos que se seguiram após a sua entrada no hospital; por outro, agradecer o apoio da comunidade e reconhecer o feito daqueles que o trouxeram à vida. A sua publicação, em baixo, é de forma integral, sem qualquer corte ou edição. 

 

--

Hoje decidi escrever sobre o evento que marcou e marcará para sempre a minha vida. O dia em que o meu irmão Pedro teve um acidente a surfar na Pedra Branca.

 

No próprio dia do acidente tinha enviado um texto que escrevi há uns anos para mostrar aos meus irmãos quando fôssemos mais velhos, a explicar o quanto gosto deles… mas, nesse dia, não sei por que carga de água, quebrei a regra e enviei aos dois. O Pedro leu-o antes de entrar no mar. 

 

Por isso, agora escrevo a todos os meus irmãos surfistas este texto com o simples propósito de vos lembrar de escreverem mais (ou dizer mais) a quem amam. Não percam tempo com vaidades, orgulho ou futilidades, de um dia para o outro podem perder as pessoas que mais amam neste mundo ou vice-versa. Aproveitem o melhor que a vida vos dá: a família, saúde e ondas, claro. O resto é treta.

 

Foi no dia 29 de novembro de 2016, na véspera de ir de férias para Lisboa, a contar os minutos para sair do escritório em Albufeira, que começo a receber pedidos de mensagem no Facebook. Era o Eduardo Fernandes. Percebi imediatamente que se tratava de alguma coisa com o meu irmão Pedro. O Eduardo só me pediu para telefonar para um número, e eu, friamente, liguei e paralisei com o que o me diziam. Não queria acreditar na gravidade da situação. Falei com o Vasco Inglez, que tinha acabado de reanimar o meu irmão após ter sido resgatado do fundo do mar. De seguida entrei na sala do meu chefe e consegui soletrar que iria para Lisboa de imediato.  

 

"Se o Universo não tivesse conspirado para que estivessem lá,

naquele dia e àquela hora, não era esta a história que vos contava"

 

Foi a viagem mais longa da minha vida, mas graças ao meu primo João Macedo, ao Vasco e ao José Castro da Guincho Surf School, lá me consegui acalmar ao volante. Apesar de mais calmo, achava que ia perder o meu irmão com os relatos que me transmitiam. A Surftotal acabou por os descrever num artigo que aqui transcrevo:  

 

“Traduziu-se numa perfuração do pâncreas, uma costela partida, maxilar partido e pneumotórax, segundo a Surftotal apurou através de vários testemunhos. A queda foi tão violenta que Pedro ficou uns bons segundos submerso, tendo sido resgatado por dois bodyboarders que juntamente a um fotógrafo que se encontrava no local os ajudou a fazer a reanimação em plena areia. A reanimação durou cerca de meia hora e também contou, mais tarde, com a assistência dos Bombeiros Voluntários da Ericeira e do INEM.”

 

Queria chegar o mais rápido possível, não parei de ligar para a receção do Hospital de Santa Maria para saber se o meu irmão já tinha chegado. Quem me atendeu, muito obrigado pelas 20 vezes que falou comigo nessa noite.

 

Esperava chegar e ouvir umas palavras tranquilizadoras do médico, de que o meu irmão estaria fora de perigo, mas já com os meus pais ao lado o que ouvimos foi: “Não sei se o seu irmão passa desta noite.” Isto dito num tom de quem estava indeciso entre uma bica ou meia de leite. Pensei logo que o esbofeteava ali se a vida do meu irmão não dependesse das suas mãos. Dizer isso assim, a cru, à minha frente e da minha mãe, foi tão desumano quanto os piores atos de guerra de que já ouvi relato. 

 

Percebi que a minha mãe, desse momento em diante, apagou e já só queria rezar. Pediu ao médico para ficar a rezar ao lado do meu irmão, ao que a resposta foi: “Isso não vai adiantar de nada minha senhora.” Sabiamente, a minha mãe retorquiu: “Doutor. no plano físico você atua e agradecemos a sua sabedoria, mas no plano espiritual deixe comigo e com os anjos, o Pedro também irá precisar deles.”

 

Só podia entrar uma pessoa no quarto, por isso, a minha mãe foi primeiro. Após contornar vários corredores e seguranças, lá consegui entrar também na sala onde estava o meu irmão onde deparei com uma imagem que não sairá da minha cabeça. Jamais. O meu irmão deitado, em coma, cheio de cortes no tronco, com o maxilar torcido e partido, com ligaduras… e a minha mãe ao lado a rezar.

 

"O mundo do surf é muito mais do que campeonatos e marcas,

é esta energia que sentimos e que não tem paralelo na nossa sociedade"

 

Muito resumidamente os dias que se seguiram foram capazes de sugar a minha e a alma dos meus pais e também do meu irmão Zé. Parecíamos uns “zombies", a vaguear pelos corredores do hospital, à espera de boas notícias.   

 

Agora, volvidos estes quatro meses, posso dizer que tivemos muita sorte por poder ter o Pedro de volta, são e salvo e a surfar novamente cheio de pica.

 

Passado este tempo posso bem agradecer ao Vasco, ao “Balin” e ao Tiago que salvaram a vida ao meu irmão. Se o Universo não tivesse conspirado para que estivessem lá, naquele dia e àquela hora, não era esta a história que vos contava. E bem conspirou pelo que me contaram. Nas palavras de um sábio irmão que ganhámos: “Fomos peões de algo bem maior do que nós."

 

Também agradecemos ainda à excelente equipa e condições de que o Hospital de Santa Maria dispõe. Por último, um sincero agradecimento a todos os amigos e conhecidos que enviaram as mensagens mais incríveis de motivação e apoio. O mundo do surf é muito mais do que campeonatos e marcas, é esta energia que sentimos e que não tem paralelo na nossa sociedade. 

 

Este mundo tem muito a ganhar e a aprender com o meu irmão Pedro com a sua dedicação e perseverança e, apesar de este ano pela primeira vez não ter participado na liga nacional de surf, levou, sem dúvida, um troféu para casa.

 

Força aí brother, és um ídolo para todos nós! 

 

- João Monteiro de Barros

 

--

>> RECORDA AQUI A ENTREVISTA COM PEDRO BARROS

 

 

Perfil em destaque

Scroll To Top