FANECA, O HOMEM QUE VENCEU 1º CAMPEONATO DE SURF NOS COXOS

"Têm toda a legitimidade para dizer que sou o Campeão invicto nos Coxos!"

 

Fernando Ferreira Faneca é uma lenda viva do Surf português, surfista com atitude, destemido e bom amigo do seu amigo. A Surftotal esteve à conversa com o homem que ganhou o único campeonato de surf que se realizou nos Coxos.

"Em 89 as condições estavam como a organização queria: Swell entre 2,5/3 metros com força e bom vento, os surfistas tinham todos assinado o termo de responsabilidade (exigência da organização) em folha  azul e com assinatura reconhecida no notário, não fosse Neptuno tecê-las" - Faneca

 

 

Surftotal:Em que ano começaste a surfar, e como surgiu a ideia?



Faneca: Não me recordo muito bem mas terá sido por volta de 1972, 73. Depois das aulas ia com o meu amigo e "class mate" Luís Narciso para a Estalagem Narciso na praia de Carcavelos. Vivia na altura no Alto dos Lombos. Em 74 fomos viver para São Pedro do Estoril e foi na “ Capital do Império” que continuei a divertir-me no Reino de Neptuno.




Começaste a entrar em competição logo no início ou mais tarde?




Nos finais de 70 em São Pedro do Estoril em campeonatos organizados pelo Surfing Clube de Portugal fundado creio que 1978 com sede na ASPA ( Associação Amigos de São Pedro ), e também na Costa da Caparica em Carcavelos, Aveiro, Figueira da Foz.




Quem eram os teus amigos surfistas na época, e na tua visão quais os que gostavas mais de ver a surfar?




Mantive sempre uma grande amizade com o Luís Narciso, excelente surfista e homem do mar, e um dos primeiros empresários do surf em Portugal. Em São Pedro tinha, e tenho, um grande respeito por todos, mas olhava muito para o Tó Vieira o “Manel Lobão”, o Pedro Machado e o Pedro Melo, bons amigos e grandes mestres das ondas. Carcavelos (surf concentrava-se entra a esquerda tubular do calhau e o Narciso) tinha excelentes surfistas mas para mim era o TóPê Rocha e o Paulo Inocentes quem mais se destacava. À escala do que era o surf em Portugal naquela altura, o Paulo Inocentes era pura e simplesmente de “outro planeta”. Recordo-me de grandes surfadas de Inverno nos Coxos com o Inocentes dentro de água e os bifes australianos, que já surfavam nas horas, absolutamente pasmados com o nível de surf do Paulo que veio mesmo a ser patrocinado por uma marca de pranchas aussie ; TubeLine. Depois apareceram outros; Em São Pedro do Estoril o Miguel Vieira, irmão mais novo do Tó, em Carcavelos o “Peixe” o Litri, na Costa o Zézinho Lafuente e no Porto o Rui Ribeiro.
 

Conciliavas o surf com o hóquei em patins, como conseguias estar ao mais alto nível em duas modalidades tão diferentes?




No hóquei preocupava-me em estar ao mais alto nível, porque como desporto colectivo que é, tem de haver união e sacrifício de grupo. Eu dependia da equipa e vice-versa. Treinava todos os dias. Havia pressão. Era a sério. No surf não, não sentia qualquer tipo de pressão. Mesmo nos campeonatos, entrava sempre com um espírito descontraído. As provas de surf era um convívio entre conhecidos e amigos. Vendo bem, estávamos a ser pioneiros na organização de campeonatos de surf em Portugal. No hóquei não, a realidade era muito diferente, mas é curioso que fiz grandes jogos depois de ter passado umas horas a surfar...As duas modalidades complementavam-se em muitos aspectos.


Ganhaste o primeiro campeonato de ondas grandes nos Coxos, organizado pela Billabong através do Alex Oliveira, foi o teu momento mais alto como competidor? Como recordas estes míticos (existiram dois) campeonatos de ondas grandes nos Coxos?



Exacto, ganhei o de 1989. O de 90 não acabou porque tivemos stormy conditions...Na altura era Billabong e Semente Surfboards team rider e o meu “quintal” era naturalmente os Coxos. As condições que encontrámos nos dias do campeonato eram normais para mim e outros que estavam em prova como é o caso do;  Zézinho, Nick Uricchio, Miguel Ruivo, Michel, Kika. Há anos e anos que surfávamos os grandes “sweis” tranquilamente entre amigos. Pode dizer-se que estávamos dentro de água bastante à vontade com o mar grande. Em 89 as condições estavam como a organização queria; Swell entre 2,5-3 metros com força e bom vento, os surfistas tinham todos assinado o termo de responsabilidade (exigência da organização) em folha  azul e com assinatura reconhecida no notário, não fosse Neptuno tecê-las. Foi uma vitória que soube bem. Sempre gostei de surfar com meu amigo Miguel Ruivo e os nossos heats foram sempre bem disputados. Fizemos várias finais e a única que lhe ganhei foi precisamente num spot onde muitos pensavam que a vitória iria para o Miguel. Foi o front-side x back-side, e confesso que sem a ajuda da maré (bastante cheia), o Miguel podia mais uma vez ter levado a taça, com um dos seus tubinhos. Podia! Recordo-me também que em 89 e 90, o Miguel Fortes já mostrava atitude. No campeonato de 1990 as condições ficaram fora de controlo. Entrou vento moderado de Oeste com o swell a crescer desordenado e a organização cancelou bem o campeonato, para nunca mais voltar a repetir-se. Têm toda a legitimidade para dizer que sou; O Campeão invicto nos Coxos! Não creio que a vitoria em 89 tenha sido o meu ponto alto em termos competitivos. Antes deste momento tive outros e depois em 93, no Campeonato da Europa por países em Thurso na Escócia, consegui um segundo lugar na classe sénior men.




Como vês a mudança do surf da época para agora?

 
É incrível o salto que deu. Na altura éramos poucos mas hoje o surf é, a nível nacional e internacional um dos desportos com mais mediatismo e crescimento.  Temos uma industria que mete respeito a países com muito mais tradição no surf, como é são a França e a Inglaterra. Em termos técnicos o surf era bastante pobre, não havia treinadores, havia muito individualismo. Nos anos 80 começámos a ter algumas das grandes marcas ter representação em Portugal e o cenário começou a mudar com patrocínios, apoios e mais campeonatos para promover essas marcas. Foi um bom impulso. Hoje há escolas e a evolução para quem começa é muito rápida. O surf está consolidado na nossa cultura. Existe muita informação disponível, as previsões de mar nos sites que conhecemos permite aos jovens, escolas, etc organizarem-se. Na minha altura era o dom do olfacto...Por exemplo, no caso do campeonato dos Coxos, sabíamos que estava a entrar um bom swell mas não sabias até onde iria em tamanho, período etc. Entravas com fé em ti, e em Deus.


Como concilias o surf neste momento com a tua vida profissional e familiar?



Aos 50 surfas quando podes e não quando queres. Meia hora de surf sabe-me a glória! Gosto de desfrutar do mar com os meus filhos e amigos e quando estou dentro de água o tempo parece que anda para trás. Na onda já não tenho a mesma pressa e dedico-me a contemplar. A desfrutar o momento. Já não faz qualquer sentido aquela correria das manobras e dispêndio de energia de há trinta ou anos atrás. Quando posso apanho umas ondas na “Capital do Império” ( a.k.a. São Pedro do Estoril ), e às vezes, muito poucas, quando as condições prometem dou um salto à Ericeira, e assim que vou gastando wax !
 
 



Por Bernardo Seabra

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