“PARA O BENEFÍCIO DO DESPORTO, PENSO QUE UMA EVENTUAL VITÓRIA DE MEDINA É MAIS IMPORTANTE QUE O 12º TÍTULO DE SLATER”

O tour manager do circuito mundial garante que o pico da mota será uma possibilidade para a prova acontecer

 

Natural de Florianópolis, Renato Hickel, de 51 anos, foi surfista profissional e juiz da modalidade durante 11 anos. O tour manager do circuito mundial de surf esteve a conversa com a Surftotal.

Que mudanças efetivas se notaram no tour com a nova direção na ASP?

Acredito sem dúvida que mudámos para melhor. Em termos de benefício para os atletas, principalmente para as meninas, no surf feminino.As etapas aumentaram para 10, trazendo algumas provas de volta com Fiji, e outras que nunca estiveram ,como Trestles e o retorno de Maui, que vai ser a última etapa, onde se vai decidir o título deste ano. Depois o aumento do prémio por etapa, que passou a ser de 250 mil dólares. Nota-se a  preocupação desta administração em melhorar a experiência do fã, não só pelo broadcast via web e tv, mas também nos sites dos eventos, nos locais onde os eventos ocorrem. A preocupação que não existia ou que não era tão alarmante na administração anterior e que é visível agora… desde melhorar as áreas de competição, centro de hospitalidade para os atletas, para os familiares, amigos dos atletas, para os VIP, para os media e também para o público em geral que vem à praia e não se sente isolado da competição.

Além disso, em termos gerais, para nós da antiga ASP, que sempre sonhámos em ter um departamento de vendas, um departamento de marketing, a própria produção de broadcast, que tem estúdios para fazer esse incremento do broadcast, e ter principalmente condições financeiras de melhorar o padrão técnico do circuito. Isso é um sonho que finalmente foi alcançado para nós. Costumo dizer que a gente viajava, fazia o tour até dois anos atrás, com cerca de 16 a 18 pessoas. Hoje esse número varia de 70 a 90. Só por aí dá para ter uma ideia do quanto a estrutura melhorou. O suporte que a gente tem agora e que não tínhamos antigamente para melhorar o padrão das provas do WCT. Isso agora vai esticar-se para as provas prime, aliás já está a acontecer com a implementação do vídeo replay e da prioridade da bateria de três e quatro homens nas provas do QS. A ideia é estender ainda às provas de estrelas do circuito mundial de qualificação.

 

Nota-se que há uma preocupação dos media na divulgação de informação, tentando atrair mais público diversificado. O surf está a chegar a mais pessoas a nível mundial?

 Sem dúvida. Essa preocupação em termos de departamento foi notória e até começamos a trabalhar com mais pessoal para atingir um maior número de meios de comunicação. E o mais interessante é que, neste final de época, estamos a assistir ao regresso de muitos media, tanto na imprensa como na televisão, que há alguns anos pararam completamente de cobrir os campeonatos de surf ou relaxaram nessa cobertura e agora estão a voltar com toda a força. Vê-se isso aqui em Portugal e até no Brasil. Óbvio que no Brasil isso é mais gritante, porque é o Gabriel que está com uma mão no título e a gente vê os grandes canais de televisão, os grandes jornais brasileiros retornando ao surf profissional.

 

Por falar em Medina, o que muda se Gabriel ganhar?

Bom, primeiro Gabriel tem que vencer, não é? Muita gente já está falando que ele é campeão, mas ainda não é. Não podemos esquecer que temos o “careca” com onze títulos, experiência nas costas, louco para roubar esse título e cravar o 12º. Então, se o Gabriel conseguir vencer, acho que vai ser muito benéfico, não só para o Brasil, que será certamente uma coisa grandiosa aliás, já está sendo  com a campanha “vai Medina” suportada por todos os ícones do desporto brasileiro. Penso que o país atualmente carece de um herói desportivo. A gente não tem mais o Guga [ex-tenista profissional brasleiro] e o nosso futebol foi um fiasco na última copa do mundo. A gente tem o pessoal do volley fazendo bonito, mas fora isso não tem muito destaque internacional e se o Gabriel ganhar esse título, vai passar a ser um dos heróis.

Agora, tirando a bandeira e a camisola e se analisarmos friamente para o benefício do desporto, penso que uma eventual vitória de Medina é muito mais importante que o 12º titulo do Kelly Slater porque o Gabriel  acumula a condição de um garoto que não teve uma infância tão rica. A gente sabe que a família dele teve que lutar e muito para chegar onde ele está. E isto pode ser encarado como um sonho que vai ser transmitido a milhares de jovens de outros países.

Vimos recentemente na etapa de Trestles o apoio que o Carlos Munoz, que é da Costa Rica, teve… o país inteiro apoiou-o. Como o Carlos, há outros exemplos. Pode haver um garoto na China, na Tailândia, no Japão, no Chile até aqui nos países da Europa que estão a começar agora e podem começar a acreditar que o título mundial é possível. Basta ter talento, garra, vontade de vencer e conquistar.

Penso que para o desporto em geral e para o surf profissional o título indo para Gabriel quebra também essa hegemonia australiana e americana/havaiana (Não vamos esquecer o título do sul-africano Shaun Tomson).

 

Sabemos que, nos últimos dias, alguns atletas estão a surfar na praia dos Belgas. Era possível terem feito lá o primeiro round ou há muita inflexibilidade nesse sentido, em mudar a prova para um lugar que não seja o alternativo?

Não, de maneira nenhuma. A prioridade é sempre Supertubos, claro. A gente vem a Peniche para surfar Supertubos. Esta é a onda de qualidade internacional, é uma das melhores ondas do mundo e é por causa dela que a gente está aqui. E as provas do WCT, o conceito de dream tour é ter pelo menos 75% das provas do circuito em ondas de qualidade na melhor época do ano e para isso temos um período de espera. Ontem, no terceiro dia da janela, não havia razão para mudar a prova, apesar de termos ouvido que havia ondas muito boas e que os competidores estavam surfando nos Belgas, especialmente no pico do fabril e no pico da antena. O pico da mota não estava tão bom, e esse será o nosso backup, porque para quem também não conhece existe o problema de acessibilidade à praia e tem que ser um lugar onde se possa colocar uma estrutura. Tanto na antena como no fabril não é possível fazer uma instalação. Estamos prontos para mudar se for preciso. Quem é da região também sabe que as condições meteorológicas mudam muito rapidamente, principalmente em relação aos ventos. Há aquela esperança de nos próximos dias, com o swell que está a chegar hoje à noite, nas próximas 12/24 horas, o vento virar para norte/ noroeste e aí sim terminamos a prova em condições de gala. Se isso não acontecer, temos condições de mudar e pode ir para o pico da mota na semana que vem.

  • Créditos fotos: Tiago Segurado/Surftotal

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