O futuro do surf em Portugal:“Enquanto o fizer feliz, estarei ao seu lado” Alexandra, mãe de Matias Lopes sexta-feira, 23 maio 2025 19:31

O futuro do surf em Portugal:“Enquanto o fizer feliz, estarei ao seu lado” Alexandra, mãe de Matias Lopes

Os desafios, motivações e esperanças de quem acompanha de perto a construção de um sonho.

 

Mãe de Matias Lopes, campeão regional de surf, Alexandra Martins partilha no fórum Surftotal os desafios, motivações e esperanças de quem acompanha de perto a construção de um sonho.

No âmbito do fórum Surftotal sobre o futuro do surf em Portugal, a palavra vai também para quem vive o desporto através do amor incondicional: os pais. Desta vez, é Alexandra Martins, mãe de Matias Lopes, jovem talento do surf nacional e atual campeão regional, quem nos dá o seu testemunho — direto, ponderado e com profundo conhecimento da realidade do surf de competição.


Felicidade, equilíbrio e compromisso

“A nossa principal motivação é vê-lo feliz e a crescer de forma saudável. O surf competitivo foi uma extensão natural da ligação que o Tomás sempre teve ao mar.”

Para Alexandra, o apoio é incondicional, desde que a prática do surf continue a fazer sentido para o filho. E esse apoio não é só logístico: é emocional, humano e atento ao equilíbrio entre treino, escola e vida pessoal. O surf, explica, tem sido também uma ferramenta de crescimento emocional: aprender a lidar com a superação, com a frustração e com a responsabilidade de ser atleta.

O que a motivou a apoiar o seu filho/a na prática do surf competitivo?


Como pais, a nossa principal motivação é ver os nossos filhos felizes, realizados e a crescerem de forma saudável. Foi exatamente isso que me levou a apoiar o Matias na prática do surf competitivo. Desde muito novo, o Matias demonstrou uma grande ligação ao mar e ao surf, começando pelo free surf, numa abordagem mais lúdica e espontânea. Com o tempo, sentiu vontade de evoluir e entrou numa escola de surf, onde pôde desenvolver a técnica e a consciência desportiva.
Por volta dos 10 anos surgiu a oportunidade de participar nas primeiras competições, ainda nas camadas de formação. Aceitou o desafio com entusiasmo e, desde então, tem vindo a crescer não só como surfista, mas também como jovem atleta, aprendendo a lidar com a disciplina, a superação e até com as frustrações naturais do desporto.
Enquanto o surf competitivo fizer parte dos seus objetivos e continuar a ser algo que o motiva e faz feliz, estarei ao seu lado para o apoiar incondicionalmente. Para além do incentivo prático e logístico, considero fundamental estar presente ajudando-o a manter o equilíbrio entre o desporto, os estudos e a vida pessoal, promovendo sempre uma abordagem saudável, consciente e sustentável ao seu percurso.
 


Os grandes desafios: tempo, escola e dinheiro

Como tantas outras famílias, Alexandra destaca três grandes desafios:

  • Conciliar treinos e competições com o percurso escolar

  • Gerir a exigência emocional e física

  • E sobretudo, suportar financeiramente o sonho

“As deslocações, as inscrições, o material técnico — tudo isso implica um investimento significativo ao longo do ano.”

Mesmo com paixão e organização, o caminho tem exigido sacrifícios e muita procura por apoios externos que nem sempre surgem com facilidade.

 

Quais os maiores desafios que têm enfrentado no percurso do seu filho?


Ao longo do percurso do Matias no surf competitivo, os maiores desafios que temos enfrentado prendem-se sobretudo com a conciliação entre a vida escolar e a exigência crescente da prática desportiva. À medida que os treinos se intensificam e as competições se tornam mais frequentes, torna-se um verdadeiro exercício de equilíbrio garantir que o seu rendimento escolar não é comprometido e que consegue manter uma rotina saudável e estruturada.
Outro grande desafio tem sido, sem dúvida, o fator financeiro. O surf competitivo é uma modalidade que implica um investimento significativo ao longo de todo o ano. Para além dos custos associados às deslocações — muitas vezes longas e frequentes, tanto a nível nacional como internacional — há ainda as inscrições nas provas, que podem ser bastante elevadas, especialmente nas competições fora do país. A isto somam-se os gastos com o material técnico, que precisa de ser constantemente renovado ou ajustado, sobretudo para atletas que já competem na categoria Open, onde a exigência é maior.
Apesar destas dificuldades, temos procurado encontrar soluções que permitam ao Matias continuar a trilhar este caminho com paixão e compromisso, com o apoio da família, do seu treinador e, sempre que possível, com o envolvimento de parceiros e apoios externos que reconheçam o valor do seu esforço e dedicação.

 


Apoio da Federação e dos clubes: muito aquém do necessário

“Até hoje, o Tomás nunca beneficiou de apoio logístico ou financeiro, nem do clube, nem da Federação Portuguesa de Surf.”

Alexandra reconhece que há uma falha estrutural no apoio a atletas em desenvolvimento. Sugere a criação de programas técnicos estruturados, ações regulares em Centros de Alto Rendimento e um maior envolvimento da FPS e dos clubes na preparação e valorização dos jovens talentos.

“Os treinos regulares, as inscrições, tudo continua a ser custeado pelas famílias. Isso não pode ser sustentável no longo prazo.”

 

Sente que há apoio suficiente dos clubes e da federação?


No nosso caso, não sentimos que haja apoio suficiente, nem da parte do clube onde o Matias está federado, nem da Federação Portuguesa de Surf. Até ao momento, o Matias nunca beneficiou de qualquer tipo de apoio logístico ou financeiro, seja para a inscrição nas provas ou mesmo para a inscrição anual na federação. Todas essas despesas têm sido integralmente suportadas por nós, enquanto família.
Além disso, considero que há margem significativa para melhorar o apoio formativo aos atletas em fase de desenvolvimento competitivo. A FPS e os clubes poderiam, por exemplo, dinamizar programas de aperfeiçoamento técnico em parceria com treinadores especializados em surf de competição, promovendo ações regulares nos Centros de Alto Rendimento espalhados pelo país. Que eu tenha conhecimento, essas iniciativas não estão atualmente a acontecer ( a não ser aquelas dirigidas aos atletas da seleção nacional). Mesmo os treinos regulares ao longo do ano são, regra geral, custeados pelas famílias dos atletas, o que representa um esforço considerável, especialmente quando falamos de desporto de alto rendimento.
Acredito que, com uma estrutura de apoio mais consistente por parte dos clubes e da federação, seria possível não só aliviar esse peso sobre as famílias, mas também potenciar o talento e o desenvolvimento dos jovens surfistas em Portugal.

 

Matias Lopes - Tomané Photography

Sair de Portugal? Só se valer mesmo a pena.

“Portugal tem condições naturais incríveis, e o valor emocional de estarmos em casa é grande.”

Ainda assim, Alexandra admite que, se surgirem oportunidades no estrangeiro com melhores condições, apoio técnico ou estrutura competitiva, poderá ser uma hipótese a considerar, especialmente para atletas que queiram dar o salto para o circuito profissional.

 

Consideraria mudar para outro país se surgissem melhores oportunidades?


A mudança para outro país teria de ser muito bem ponderada e justificar-se por uma oportunidade verdadeiramente significativa. Portugal oferece excelentes condições naturais para a prática do surf — temos uma extensa linha de costa, sol durante grande parte do ano e ondas de qualidade reconhecida a nível internacional. Além disso, há um valor emocional inegável em estarmos no nosso país, na nossa casa, com a família por perto.
No entanto, quando se trata de atletas da categoria Open que começam a competir regularmente em provas internacionais, podem surgir oportunidades fora que façam sentido considerar, sobretudo se envolverem melhores condições de apoio, patrocínio ou acesso a estruturas de treino mais especializadas. Até agora, ainda não vimos esse tipo de mudança acontecer de forma expressiva com os atletas portugueses, mas acredito que, se o objetivo for evoluir no circuito profissional, essa hipótese poderá tornar-se realista num futuro próximo.

 

Matias Lopes - Tomané Photography

Este testemunho sincero é mais um contributo importante no debate que a Surftotal pretende alargar a todo o ecossistema do surf português. O futuro do surf passa também por quem o vive nos bastidores, de forma silenciosa mas essencial: as famílias.

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