A análise vem comprovar que John John Florence é um campeão mundial justíssimo. A análise vem comprovar que John John Florence é um campeão mundial justíssimo. Foto: WSL/Kelly Cestari segunda-feira, 19 fevereiro 2018 15:36

Um olhar científico sobre o surf

Terá a competição de surf a consistência e a validade que se exige hoje em dia?

 

Por Pedro B. Júdice, Surfista e Investigador Doutorado na Faculdade de Motricidade Humana da Universidade de Lisboa e Professor na Faculdade de Desporto da Universidade Lusófona. 

 

A popularidade do surf continua a aumentar de forma exponencial no panorama desportivo à escala mundial. Seja através do mediatismo associado ao surf de ondas grandes, ou nos recentes passos dados no sentido de integrar o surf como desporto Olímpico, o que vai acontecer já em 2020, Tóquio. Ora, com todo este mediatismo e “profissionalização” do surf, surge também a necessidade de se “standardizar” um desporto que é na sua origem livre, selvagem e quer queiramos ou não, na opinião de muitos, um tanto ou quanto subjetivo.

 

Aproximando-se a passos largos, o início da competição mãe do surf mundial (2018 Championship Tour da World Surf League) é tempo de olhar para trás e perceber, se a competição tal como está desenhada nos dias de hoje, tem a consistência e validade que se impõe a um deporto que, tal como dissemos anteriormente, está prestes a juntar-se à família Olímpica.

 

De uma forma simplista, podemos afirmar que em última instância o surf é avaliado pela performance do surfista em cada uma de duas ondas, que no final de um período de tempo estabelecido (heat), constituirá um score total onde cada atleta poderá atingir a pontuação máxima de 20 valores (10 em cada onda). Para vencer um “Heat”, esse total terá de ser superior ao dos seus opositores e para vencer uma etapa, interessa que um surfista vá somando heats e progredindo na prova até chegar à final e vencê-la. 

 

Cada etapa é constituída por várias fases - Rounds 1, 2, 3, 4 e 5, quartos de final, meias finais e final - sendo que se os surfistas vencerem no round 1 e 4 saltam os rounds 2 e 5, respetivamente. Isto significa que, de acordo com o desenho competitivo atual, cada surfista terá duas oportunidades para que mesmo perdendo o Heat, consiga progredir até à final e ainda assim vencer a etapa. 

 

Consoante o lugar atingido em cada etapa, o surfista ganha um total de pontos que é tanto maior, quanto mais longe chegar na prova (ex: 500 pontos pelo Round 1 e 10.000 pontos se ganhar a etapa). No final da época desportiva, após completadas as 11 etapas, será consagrado campeão mundial de surf, o atleta que obtiver uma maior pontuação no total das 9 melhores etapas, descartando assim as duas piores etapas.

 

Não é raro ver responsáveis e profissionais de outras modalidades questionarem a validade e seriedade do julgamento no surf e, por essa razão, pretende-se aqui expor aquilo que é um reflexo da época de 2017. Para tal, fizemos uma recolha e análise de todos os Heats levados a cabo nas 11 etapas do World Tour, dos 10 atletas que terminaram no topo do “ranking no final do ano. Desta forma, tentámos perceber se a pontuação média resultante de todos esses Heats (que deverá ser proporcional à performance do surfista) se associa com o ranking desse mesmo atleta no final do ano (ver tabela em anexo).

 

Valores com base em todos os heats das 11 etapas de 2017

* O número em expoente significa o ranking em termos de score médio (performance).

 

Alguns factos:

• O desenho competitivo atual permite distinguir o melhor surfista do Mundo de uma forma clara, sendo que o 1.º lugar no ranking apresenta também o maior score médio e, portanto, a melhor performance.

• O 2.º lugar do ranking corresponde também à segunda melhor performance, demonstrando mais uma vez a validade do sistema de avaliação.

• No entanto, a partir do 3.º lugar no ranking podemos verificar alguma falta de  correspondência entre o lugar no ranking e o nível de performance médio exibido pelos atletas. Ou seja, tirando o 4.º e 6.º lugares do ranking que correspondem ao quarto e sexto melhores scores médios, para todos os outros não existe correspondência, (veja-se o caso do 3.º lugar do ranking que apresenta apenas o sétimo melhor score médio, ou o caso do 10.º lugar do ranking que tem a terceira melhor média do circuito).

 

Assim, desta análise podemos concluir que o modelo de avaliação e classificação implementado pela WSL está de boa saúde e é válido, permitindo distinguir com eficácia, não só o atleta com a melhor performance ao longo do ano, mas também o segundo melhor atleta. No entanto, deverá existir um esforço no sentido de melhorar este mesmo sistema de avaliação, uma vez que existe ainda alguma fragilidade na correspondência entre o lugar e a performance nos restantes atletas do top 10.

 

Deitando alguma lenha para uma fogueira que já vem ardendo, curiosamente todos os atletas que apresentam performances inferiores ao lugar que ocupam são maioritariamente australianos, sendo que o inverso acontece sobretudo aos surfistas oriundos do Brasil.

 

Boas ondas!

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