A saúde mental e o surf via tickettoridegroup.com segunda-feira, 13 junho 2022 08:28

A saúde mental e o surf

Em parceria com a clínica Mindpoint.

 

 

Qual a relação entre surf e saúde mental? Será que entendemos a relação bidirecional entre as duas coisas? Na realidade, o surf, assim como qualquer prática desportiva, impacta a saúde mental e também é impactado por ela.

De uma forma simples, o surf como prática desportiva pode contribuir para uma melhor saúde mental, uma vez que promove o bem-estar e o relaxamento, ajuda a diminuir sintomas de ansiedade e depressão, promove competências socioemocionais como a gestão da frustração, a motivação e persistência, entre outras.

Por outro lado, a saúde mental afeta a performance desportiva no surf, uma vez que surfistas que apresentem problemas na sua saúde mental, como por exemplo níveis elevados de ansiedade, terão um desempenho inferior e poderão ver a sua performance desportiva limitada.

Deste modo, neste artigo pretenderemos explicar de forma mais completa a relação entre o surf e a saúde mental, suportando esta explicação com exemplos e dando também algumas dicas práticas que poderão ser úteis na melhoria da performance desportiva e da saúde mental dos surfistas de forma geral! É um artigo que surge da parceria com a clínica Mindpoint, cujo website pode ser consultado através deste link.

 

 

Porque devem os atletas estar atentos à sua saúde mental?

 

Praticantes de surf e, na realidade, de qualquer modalidade desportiva, procuram dar o seu máximo e estão frequentemente a testar os seus limites. Além disso, os atletas têm muitas vezes de fazer escolhas difíceis e lidar com algumas privações: no que podem comer, nas atividades que podem fazer, no tempo que podem despender e de que forma o podem fazer.

Ter um compromisso com o surf e com o desporto de forma geral é desafiante e traz dificuldades, que podem ser tanto maiores quanto maior o grau de exigência e o nível em que o atleta se encontra. Estas dificuldades refletem-se muitas vezes na saúde mental, e surgem desde muito cedo, em fases da vida em que nem sempre estamos preparados para lidar com elas, como a adolescência. Não é fácil para um adolescente não poder sair com os amigos porque tem de treinar.

Para além de todas estas particularidades, temos ainda de considerar que o surf é exigente do ponto de vista psicológico e emocional: exige resistência, exige motivação, exige capacidade de lidar com medos e frustrações, exige capacidade de lidar com a derrota, exige capacidade de lidar com o desconforto físico, exige capacidade de fazer escolhas, exige lidar com a expectativa e o medo da desilusão… Enfim, há uma série de exigências que o desporto coloca no que diz respeito às nossas capacidades psicológicas e emocionais.

Se os surfistas não estiverem atentos à sua saúde mental, correm o risco de que estas exigências sejam demais e conduzam a um ponto de rutura. Este ponto de rutura pode significar problemas de saúde mental (como ansiedade ou depressão), mas também o comprometimento da performance desportiva e da capacidade de competir. Saúde mental é saúde; e, quando não há saúde, não há espaço para mais nada, o que inclui o surf.

 

 

O que o caso de Gabriel Medina nos demonstra sobre a saúde mental

 

O surfista Gabriel Medina esteve ausente das competições por motivos de saúde mental. Como acontece muitas vezes, este caso fez-nos lembrar algo que nunca deveríamos esquecer: afinal, a saúde mental é importante e afeta surfistas e atletas de alto rendimento.

O caso de Gabriel Medina pode ser um bom exemplo para compreendermos melhor a relação entre saúde mental e surf e como as duas coisas se impactam mutuamente. Importa reparar que estamos a falar de um atleta no auge da sua carreira, jovem, com excelentes resultados e com uma boa saúde física. Para muitas pessoas, essa é a imagem de alguém que jamais sofrerá de problemas de saúde mental.

Este é o primeiro ponto importante a retirar deste caso: qualquer pessoa pode sofrer de problemas de saúde mental e todos devemos estar atentos à nossa saúde mental. Problemas como ansiedade ou depressão não são visíveis ou aparentes na maior parte das vezes, e isso não quer dizer que não existam.

No caso de Gabriel Medina, muito embora a carreira desportiva estivesse no auge, a sua vida pessoal estava marcada por outros problemas. Isto mostra-nos que o surfista não se faz só de surf; tem uma vida pessoal, muitas vezes pautada por problemas e fatores de stress.  E, não raras vezes, a dedicação que o surf exige pode inclusivamente impedir tempo para a vida pessoal e agudizar alguns problemas.

De facto, muitas vezes um corpo atlético de alta performance pode ocultar uma mente frágil, pois é frequente existir pouco tempo e espaço para as emoções e para outras necessidades que não as desportivas. Quando isto acontece, a saúde mental vai, certamente, sofrer um impacto.

Gabriel Medina não é um caso isolado, existem muitos outros e a mensagem é transversal: os surfistas precisam de cuidar da sua saúde mental.

 

 

via livresurf.com.br

 

 

O surf como terapia (8 benefícios)

 

Apesar de todas as exigências que o surf e a alta competição acarretam, também é verdade que o surf pode ter um impacto muito positivo na saúde mental. Se houver espaço e tempo para tudo, o surf pode ser uma mais-valia e ser protetor para a pessoa em termos emocionais.

Na verdade, o surf pode até funcionar como verdadeira terapia, na medida em que traz inúmeros benefícios para os seus praticantes:

– Diminuição dos níveis de stress;

– Melhorias a nível do sono;

– Prevenção de sintomas de ansiedade e depressão;

– Promoção da capacidade de gestão da frustração e controlo da irritabilidade e agressividade;

– Melhoria da autoestima e autoconfiança;

– Estimulação de capacidades cognitivas como a memória ou atenção;

– Promoção de uma sensação de bem-estar generalizado;

– Promoção da socialização e da formação de relações de cooperação e amizade.

Todos estes fatores são extremamente importantes e fortalecedores da saúde mental. Deste modo, o surf pode ser um antídoto para problemas ao nível da saúde mental e a sua prática, sempre que equilibrada, é benéfica.

 

 

Porque é importante falar de saúde mental e porque é importante pedir ajuda

 

Percebemos já que saúde mental e surf estão interligados e que há uma relação bidirecional, em que um impacta o outro. Isto ajuda-nos a perceber porque é que é tão importante falar de saúde mental, bem como a importância de pedir ajuda quando necessário.

Primeiramente, falar de saúde mental é informar, e informação é poder. Se não soubermos o que é a saúde mental, a que sinais devemos estar atentos ou qual a sua importância, dificilmente podemos atuar de forma a estarmos mais protegidos e a prevenir problemas. É como na saúde física: se eu não souber que alimentação devo ter para ser saudável, como poderei concretizar isso na prática?

Assim, é fundamental que no surf se fale de saúde mental e que os atletas saibam a importância de cuidarem de si, da sua saúde mental, de equilibrarem o seu tempo, que conheçam formas de gestão do stress e da pressão… Surfistas informados e capacitados com ferramentas para monitorizar e cuidar da sua saúde mental serão não só mais competentes em termos desportivos, como também mais felizes e saudáveis.

Os resultados desportivos não se fazem só se técnica e de treino; a parte mental e psicológica tem um peso muito importante nestes resultados. Dificilmente um surfista terá um bom resultado desportivo se estiver stressado, cansado, ansioso, se não souber lidar com a pressão, se tiver múltiplos problemas por resolver…

 

 

Saber quando pedir ajuda. Conheça os sinais:

 

Desta forma, há alguns sinais a que os surfistas devem estar atentos e que podem sinalizar problemas de saúde mental:

– Sensação de que algo está errado, ou a interferir com o seu bem-estar geral e funcionamento a nível desportivo e/ou a nível global;

– Alteração no padrão de funcionamento global, ou seja, na forma como costuma agir no seu dia-a-dia e no surf em particular, que não consegue explicar ou sobre a qual sente não ter controlo;

– Presença de sintomas persistentes que não são explicados por uma causa orgânica, como por exemplo dores, taquicardia, perda de força;

– Problemas de autoestima, não se sentir bem consigo mesmo;

– Preocupações persistentes e pensamentos que surgem sem que consiga ter controlo aparente sobre eles;

– Stress exagerado ou ansiedade;

– Alterações de humor frequentes e acentuadas, difíceis de gerir;

– Sensação de desesperança em relação ao futuro;

– Inseguranças e sensação de não ser capaz de gerir ou lidar com os desafios.

Estes são apenas alguns dos sinais. Quando alguns destes estão presentes, é importante pedir ajuda. O surfista pode pedir ajuda ao seu médico assistente, procurar um psicólogo ou até mesmo conversar com a equipa com a qual costuma treinar sobre o que está a sentir, que pode aconselhar o encaminhamento.

 

 

A ansiedade de desempenho

 

A ansiedade de desempenho é um problema de saúde mental particularmente presente e frequente quando falamos de alto rendimento e competição. Caracteriza-se pelo medo acentuado e persistente de situações nas quais a pessoa sente que está exposta e/ou a ser avaliada. Assim, a ansiedade de desempenho está muito associada ao medo de falhar e a níveis demasiado elevados de exigência.

 

 

 

 

Atleta Tyler Wright conversa com o irmão, Owen Wright, depois de este ser eliminado do CT. WSL / Hughes

 

Qual a origem da ansiedade de desempenho?

 

A ansiedade é uma emoção humana adaptativa, ou seja, que existe por uma razão. Concretizando, a ansiedade é como se fosse uma espécie de “alarme interno” que temos e que nos sinaliza potenciais situações de perigo ou ameaça. Ora, quando estamos perante uma situação que encaramos como muito exigente, como por exemplo uma competição desportiva, e para a qual antecipamos consequências sérias, esse alarme vai disparar.

Deste modo, os níveis de ansiedade de desempenho estão diretamente relacionados com a forma como o surfista perspetiva e vê a competição desportiva. Portanto, isto ajuda-nos a perceber a importância da ajuda psicológica, pois em terapia muitas vezes o foco está em alterar estes padrões de pensamento e leitura da realidade.

Há alguns fatores de risco que podem fazer com que seja mais provável o surfista ter ansiedade de desempenho, nomeadamente:

– Mau ambiente desportivo e falta de apoio e suporte;

– Falta de apoio por parte de familiares ou amigos;

– Inseguranças pessoais, baixa autoestima e autoconfiança;

– Experiências de vida adversas e traumáticas;

– Familiares muito críticos ou rígidos;

– Experiências anteriores marcantes de fracasso ou humilhação;

– Níveis elevados de perfeccionismo;

– Dificuldades ao nível da expressão emocional e/ou tendência a usar estratégias pouco adequadas, como o isolamento e a repressão de emoções.

 

 

Características e sinais da ansiedade de desempenho

 

Existem alguns sintomas e sinais que nos ajudam a identificar a presença de um problema de ansiedade de desempenho, designadamente:

– Insegurança constante associada às situações de desempenho ou competição;

– Ter ótimos resultados nos treinos, mas depois não conseguir ter bons resultados nas competições;

– Medo intenso de cometer erros ou falhar;

– Vergonha de não fazer as coisas de forma “perfeita”;

– Medo de desiludir os outros;

– Preocupação excessiva com os resultados;

– Preocupação excessiva com o que os outros poderão pensar;

– Ruminação e pensamentos intrusivos, persistentes e circulares;

– Tendência a evitar situações de avaliação ou exposição ou ter cada vez mais dificuldade em enfrentar este tipo de situações;

– Alterações no sono e apetite em consequência da ansiedade sentida;

– Procrastinação, adiar tarefas importantes;

 

 

 

Competição: 8 estratégias para lidar com a ansiedade

 

– Associar aos momentos de competição coisas positivas – para que estes momentos não fiquem associados apenas à pressão e a emoções desagradáveis de medo, o surfista pode criar rituais que façam com que existam associações positivas. Por exemplo, almoçar com amigos ou outros surfistas depois da competição, combinar algo agradável para o final do dia, ter uma massagem de relaxamento…

– Realizar exercícios de relaxamento antes das competições, nomeadamente usando a respiração profunda e pausada;

– Praticar exercícios de mindfulness no dia-a-dia e nos momentos de prática desportiva também;

– Entender que a ansiedade atinge um pico, mas depois começa a diminuir naturalmente, pelo que não é perigosa nem incontrolável. Conseguir ver a ansiedade como algo natural e gerível ajuda a conseguir lidar com ela com mais facilidade;

– Transformar o discurso interno, pensando naquilo que diria a uma pessoa querida que estivesse no seu lugar;

– Fazer exercícios de visualização antes da competição: fechar os olhos e imaginar, com o maior pormenor possível, o momento da competição, desde o início, como se estivesse lá. Visualizar um desfecho positivo e evocar as emoções positivas sentidas nesse momento;

– Celebrar as pequenas conquistas e valorizar o progresso e não apenas os resultados objetivos. Por exemplo, se teve uma lesão e está a conseguir voltar lentamente a treinar, valorize cada pequeno progresso e cada treino, não pense só na competição e nos resultados que quer obter;

– Desta forma, é importante perceber quando a ajuda profissional pode ser necessária, e compreender que não há mal nenhum nisso. Por exemplo, os grandes clubes e os atletas de alto rendimento contam muitas vezes com psicólogos do desporto para os ajudar!

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