A AVENTURA DE UM CASAL SURPREENDIDO PELA PANDEMIA DURANTE UMA VIAGEM DE SURF quarta-feira, 30 dezembro 2020 11:45

A AVENTURA DE UM CASAL SURPREENDIDO PELA PANDEMIA DURANTE UMA VIAGEM DE SURF

Que lhes virou os planos do avesso...

 

Este ano de 2020 vai ficar para sempre marcado nas nossas memórias. A pandemia de covid obrigou-nos a mudar muitos dos nossos planos, a repensar na forma como vivemos e levou-nos a valorizar coisas que antes tínhamos como certas, uma delas a liberdade de viajar além fronteiras.

Nuno Morais e Maria Sanchez são um casal que, tal como muitos de nós, viu os seus planos virados do avesso.

Ele, lisboeta e director financeiro numa empresa de construção civil familiar onde trabalha com o seu pai e com o seu irmão, e ela, espanhola e desenhadora têxtil freelancer a viver em Lisboa há 3 anos, viram em 2019 a possibilidade de fazer uma pausa nas suas vidas profissionais para se aventurarem numa viagem de surf pelas Américas numa autocaravana sem data definida de regresso.

Ambos pensavam que iriam passar o ano de 2020 a viver uma aventura para mais tarde recordar. Não estavam errados, apenas totalmente alheios da verdadeira aventura que se revelou ser viajar num ano marcado por uma pandemia mundial.

 

 

 

 

 

 

Olá Nuno e Maria. Podem-nos contar quando e onde é que começou a vossa viagem?

Saímos de Lisboa no dia 12 de Julho de 2019. Voámos para Inglaterra e passámos 2 dias em Londres onde nos encontrámos com a família da Maria. No dia 15 voámos para Vancouver, no Canadá, onde a aventura começou.

 

Quais eram os vossos planos?

Basicamente, comprar uma Van no Canadá e descer até à Argentina pela PanAmerican Highway durante um ano. Inicialmente decidimos que iríamos explorar um pouco o Canadá enquanto procurávamos a Van perfeita, e assim foi. A partir daí, sabíamos que queríamos que a nossa viagem fosse maioritariamente na costa do Pacifico para podermos surfar o máximo possível, mas tínhamos pouca noção de onde nos estávamos a meter. Rapidamente percebemos que quando vives este estilo de vida “Van Life” vives muito no presente e os planos são feitos no dia a dia. Basicamente aprendemos a ir onde o swell e as boas energias nos levavam.

 

 

 

 

 

 

Quais foram os destinos por onde passaram?

Ui, foram tantos!

No Canadá estivemos 1 mês em Vancouver. Viajámos até Banff para escalar uma cascata gigante e surfámos em Tofino.

Nos Estados Unidos tivemos um mês e meio. Passámos pelos estados de Washington, Oregon, Nevada, Utah, Colorado e Califórnia. Passamos pelo Death Valley, o Grand Canyon, Yosemite, Big Sur, Las Vegas, Los Angeles, San Francisco e muitos outros sítios. Daí passámos a fronteira de Tijuana para o México.

No México estivemos nos estados de Baja California, Sinaloa, Nayarit, Michoacán, Jalisco, Ciudad de México, Puebla, Oaxaca e Chiapas.

Percorremos a maior parte de Guatemala, El Salvador, Nicarágua, Costa Rica e Panamá. Do Panamá para a Colômbia não há passagem por terra, as guerrilhas controlam a área da fronteira e por isso tivemos que mandar a Van num contentor até Cartagena das Índias. Nunca chegámos a sair da Colômbia devido ao Covid.

 

 

 

 

 

 

 

Quais foram os melhores surf spots onde surfaram em cada país?

Toda a Costa da Califórnia é incrível mas gostámos muito da zona de The hook em Santa Cruz, San Onofre e Blacks em San Diego.

No México, Nine Palms em Baja California Sur, La Ticla em Michoacan, Barra de la Cruz e Playa San Diego em Oaxaca.

Em El Salvador, EL Tunco e Playa Las Flores. Na Nicarágua, Playa Maderas em San Juan del Sur. Na Costa Rica, Dominical, Matapalo e Pavones, e no Panamá, Santa Catalina.

 

 

 

 

 

 

 

Que diferenças sentiram na cultura do surf de cada país por onde passaram?

Acho que a grande diferença entre culturas, não só, mas também no surf, é o ritmo e o calor das pessoas. Na maioria dos sítios onde estivemos a cultura do surf é mais relaxada, as pessoas passam mais tempo dentro de água, os surfistas veem o surf  muito mais como estilo de vida, do que como desporto ou  hobby. A cultura do surf na Califórnia é incrível, fizeram-nos sentir como em casa. Vemos surfistas com 70 anos dentro de água a conversar e a aconselhar os mais novos e inexperientes. Na Califórnia sentimos que a  história do surf está presente por todo o lado.

No México e na Costa Rica a cultura do surf também está muito presente, principalmente na Costa Rica onde as ondas são mais parecidas com as nossas, mais rápidas, mais pesadas e por isso os surfistas são mais jovens e mais agressivos.

Houve algumas praias onde claramente se sente que os locais não estão contentes com a quantidade de turistas, que não pára de aumentar, como o Norte da Costa Rica ou Puerto Escondido no México, mas pessoalmente não sentimos nenhum tipo de localismo agressivo em nenhum país, pois sempre fizemos questão de falar com os locais quando chegávamos a um novo spot e entrámos sempre na água com respeito.

Achamos que a cultura do surf está a crescer em todo o mundo e as américas não são exceção, mas em países como o México, a Costa Rica ou El Salvador, onde as pessoas te convidam e incentivam a partilhar a sua maneira de viver o surf, ainda podemos surfar sozinhos ou com muito pouca gente dentro de água, rodeados de pelicanos, tartarugas gigantes e golfinhos… Isso não tem preço nem comparação.

 

 

 

 

 

 

 

 

Quando a pandemia de covid atingiu o mundo vocês estavam em plena viagem. Onde estavam quando começaram as restrições e que impacto é que estas tiveram no vosso dia a dia na estrada?

Sim, estávamos na Colômbia, perto de Medellín, mas já no meio do Eje cafetero nos Andes. No início foi muito complicado, as pessoas estavam assustadas, a comunicação social passava que o vírus vinha do estrangeiro, dos turistas, o que não ajudou. Durante 3 dias fomos expulsos de todos os lugares onde parámos e a polícia não sabia o que fazer ou para onde nos mandar, só nos diziam que ali não podíamos estar. Até que fomos acolhidos por um casal, ele americano e ela colombiana, que tinham feito uma viagem exatamente como a nossa e tinham acabado de voltar a casa, uma quinta gigante no meio do Eje cafetero. Vivemos com eles durante 5 meses! A Colômbia esteve fechada internamente durante 5 meses. Não nos podíamos deslocar entre estados o que nos fez perceber que a nossa viagem tinha acabado. Para perceberem o estado de medo na América do sul, há vários países que ainda não abriram as fronteiras até ao dia de hoje.

Como resgatámos o nosso cão, o Pancho, no México, tivemos que fazer uma quarentena de 4 meses por causa dele antes de podermos entrar na Europa, e assim acabámos a viver 6 meses na Colômbia. Quando voltámos, tínhamos família, trabalho e amigos na Colômbia, hahaha.

 

 

 

 

 

 

 

A vossa viagem não correu como planearam mas de certo teve momentos que não irão esquecer. Que histórias memoráveis guardam desta experiência?

 

Temos mesmo muitas histórias para contar… O resgate do Pancho, que nos deixou lavados em lágrimas quando o encontrámos e que agora nos enche de amor. Os encontros com as guerrilhas no México. As visitas guiadas dentro da Van, aos muitos policiais que ficavam boquiabertos quando nos parávam. O dia dos Mortos em Oaxaca, que não há palavras para descrever. Subir ao Acatenango, um vulcão ativo que está em constante erupção. Passar uma hora num engarrafamento que estava a ser provocado por uma preguiça a atravessar a estrada. Surfar ao lado de tubarões, baleias, mantas e tartarugas gigantes, em sítios paradisíacos. Todos os problemas que tivemos na carrinha no meio do nada e tivemos que resolver estilo MacGyver.

Mas o mais importante e impactante foram as pessoas. Mais do que as centenas de sítios paradisíacos por onde passámos, esta viagem valeu pelas pessoas. Pela humildade, bondade e alegria com que fomos recebidos em todos os países por onde passamos. As muitas vezes que, tendo muito pouco e sem pedir nada em troca, nos ofereceram uma cama, um duche, um prato de comida ou um garrafão de água. As muitas histórias de luta e sobrevivência que ouvimos e conhecemos. Fizemos muitos amigos e conhecemos muita gente inspiradora que nos faz acreditar que ainda há muita gente boa no mundo e que não precisamos de assim tanto para sermos felizes.

 

 

 

 

 

 

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