Quais são os tipos de ondulação que atingem Portugal Continental ?
Para o Surf é esta ondulação que se procura e espera-se que venha “limpa”...
*Por Bruno Lampreia.
O estado do mar é sensível às perturbações atmosféricas, pelo que se diz “que costuma de estar tão inquieto quanto a atmosfera sobrejacente”, a ondulação é provocada pelo vento através do atrito entre a superfície do mar e da atmosfera em movimento (vento), que transfere energia para o oceano, sob a forma de um pulso energético.
A este pulso energético chamamos-lhe ondulação, que sendo originada longe da nossa costa por uma baixa-pressão, vai demorar dias a atravessar o oceano, organizando-se assim por períodos em que os agrupamentos de ondas de maior período seguem na dianteira e posteriormente observam-se períodos gradualmente menores. A este fenómeno, da ondulação gerada ao longe e que viaja até à nossa costa, chamamos-lhe na gíria do surf “groundswell”, cou num termo mais técnico “Mar de fora”.
Para o Surf é esta ondulação que se procura e espera-se que venha “limpa”, isto é, sem interferência de vento local que possa estragar o produto final, a onda que nos chega à praia. Portanto, idilicamente queremos vento “offshore”, da terra para o mar, de modo que a face da onda se mantenha por mais tempo e nos proporcione uma rampa bem lisa para deslizarmos sem qualquer tipo de superfícies acidentadas ou irregulares.
Em suma procuramos uma ondulação gerada ao longe, direcionada para a nossa costa e ainda precisamos de vento favorável para os dias em que a ondulação vai entrar e produzir ondas nas nossas praias. Então se olharmos para as cartas, de entre as várias configurações possíveis, qual a situação modelo para podermos usufruir desta ondulação perfeita?
Neste exemplo temos representado um anticiclone centrado no Golfo da Biscaia e dada a sua circulação no sentido dos ponteiros do relógio, temos um vento resultante entre NE e ENE, que é offshore em praticamente toda a costa continental e por outro lado, a meio Atlântico Norte de distância, temos uma baixa-pressão com rotação no sentido anti-horário (ao contrário dos ponteiros do relógio) a produzir uma ondulação que nos chegará organizada e sem interferências significativas à nossa costa. O resultado final é isto:
Esta configuração de alta e baixa-pressão favorece mais a Costa Oeste, no entanto se a ondulação tiver energia suficiente ou uma componente mais de Oeste também na Costa Sul se poderão observar episódios de ondas de excelente qualidade.
De acordo com o estudo do IPMA – Descrição de Agitação Marítima da Caracterização Climática da Costa, este tipo de ondulação resultante do Mar de fora costuma de ocorrer no inverno quando se desenvolve o anticiclone de bloqueio ou no verão em que o anticiclone se coloca nesta posição e impede a formação da nortada, numa situação destas observam-se em média ondulações resultantes de Noroeste e de Oeste com 1.5 a 2.0 metros e períodos a rondar os 14 segundos. Neste estudo avança-se ainda que é uma ondulação de espectro muito estreito de direção bem definida e bastante regular, mais, neste tipo de ondulação é relevante o efeito de fundo, onde os longos períodos dão origem ao aumento da altura das ondas.
Existem mais configurações possíveis favoráveis ao surf, no entanto esta é uma das disposições de altas e baixas-pressões que gera as condições mais estáveis.
Outras configurações ocorrem ao longo do ano, como é o caso do Mar de Noroeste, que implica a passagem de baixas-pressões a Norte de Portugal Continental que originam alturas de ondulação um pouco maiores, mas de curto período (2,5m@9s a Norte do Cabo Raso e 2.0m@8s a Sul do Cabo Espichel). Outra configuração de Mar de Noroeste prende-se com a posição da Alta-pressão a Oeste e uma baixa-pressão sobre a Península Ibérica que favorece uma componente de ondulação de NNW-NW (nortada), produzindo vaga com tamanhos menores e também curto período, mais intensa ao fim da tarde (1.0-1.5m@7-8s).
Mar de Sudoeste, ocorre predominantemente quando uma baixa-pressão se encontra a NW ou W da Costa Oeste, que vai originar uma ondulação de SW com zona de geração próxima à costa sendo por isso ondulação de curto período e acompanhado de vento onshore, as alturas de ondas são muito maiores consoante a intensidade da baixa-pressão (3.0-4.0m@9-10s, com alturas a chegarem a 7.0m).
Temporal de Oeste, situação típica de inverno em que sucessões de baixas-pressões com sistemas frontais atravessam as nossas latitudes, originando persistência de mar de Oeste e vaga de SW que chega a atingir 7 a 8 metros com 16 segundos, acompanhado de vento forte a moderado de Oeste.
Condições de agitação marítima na Costa Ocidental "Temporal de Oeste" in IPMA, Caracterização Climática da Costa.
Mar de Banzeiro, ocorre em condições de vento fraco de uma forma generalizada e sem fontes apreciáveis de geração de ondulação significativas para Portugal Continental, origina períodos de “flatada” e estatisticamente produz ondulação de até 0.5m.
- Costa Sul -
A Costa Sul, apesar de ser também afetada por ondulação de refração que atinge inicialmente a Costa Oeste, possui também situações muito próprias e típicas daquela região:
Mar de Sudoeste, geralmente ocorre por ação de uma baixa-pressão a Oeste ou SW de Portugal Continental, imprimindo assim uma ondulação de SW com valores a apontar para 2.0-3.0 metros com períodos a rondar os 7 a 8 segundos, em condições de vento onshore.
Mar de Levante, costuma ocorrer na presença de uma baixa-pressão a Sul ou Sudoeste da Costa Sul, promovendo assim uma circulação de Este-SE, originando ondulações de SE com 2.0 metros e 6 segundos de período. Em baixas-pressões mais intensas verificam-se tamanhos significativamente superiores em condições de temporal.
Mar de Nortada, o tipo de ondulação neste caso dá-se da terra para o mar, originada pelo vento de Norte que no verão se faz sentir e não afeta apenas a Costa Oeste. Aqui, neste caso, junto à Costa Sul, o mar apresenta-se com pequena vaga, que aumenta em direção ao largo e não tem por isso nenhum tipo de probabilidades para a prática de surf.
Mar de Brisa, a ondulação é gerada pelo efeito da brisa local, aumentando ao longo do dia e originando uma vaga residual com vento onshore.
De modo geral a melhor configuração para originar boas oportunidades de surf na Costa Sul, verificam-se com situações de “mar de fora” e dependente da posição da baixa-pressão que origina a ondulação, podendo ser de impacto em ângulo ou mesmo de refração. Por vezes pode-se proporcionar ainda episódios de surf razoável com Mar de Levante, quando originado no Estreito de Gibraltar e ao longo da Costa Sul temos offshore matinal durante as primeiras horas da manhã, sob o efeito da brisa terrestre.
Serve esta interpretação do estudo das condições de agitação marítima na caracterização climática da Costa realizado pelo IPMA, para demonstrar que existem situações modelo que favorecem a prática de Surf em Portugal Continental, sendo que a busca pelas condições ideais vai muito para além da consulta de tabelas. A análise das cartas meteorológicas na óptica do utilizador, resulta num conhecimento mais aprofundado das variáveis em ação e maximizam a qualidade do surf.