Rui Costa, responsável máximo do Capítulo Perfeito. Rui Costa, responsável máximo do Capítulo Perfeito. Foto: Arquivo Pessoal quinta-feira, 25 fevereiro 2016 17:35

RUI COSTA: “É DE QUERER FAZER ALGO DIFERENTE QUE SURGE O CAPÍTULO PERFEITO”

Fomos ter com o timoneiro do Capítulo Perfeito para falar do presente e do futuro do evento que abre a temporada competitiva em Portugal...

 

Rui Costa é o frontman do Allianz Capítulo Perfeito powered by Billabong, a prova que veio dar um novo fôlego ao Surf nacional e criar novos paradigmas na comunidade. Como a janela de espera do evento já iniciou, no passado dia 17 de janeiro, podendo este acontecer a qualquer momento, fomos até junto dele para analisarmos o presente, o futuro e também as quatro edições já realizadas.

 

Antes de mais, fala-nos um bocadinho de como surgiu a ideia/conceito do evento?

A ideia do Capítulo Perfeito surgiu em 2012. Eu estava em casa e surgiu assim do nada. Na verdade, eu sempre acompanhei os campeonatos e competi muito cedo, mesmo em miúdo. Um dos meus grandes irmãos, o “Pecas” [Pedro Monteiro], competiu muito anos e foi atleta profissional. Portanto, sempre tive uma voz ativa e acompanhei as competições. Houve sempre um “bichinho” relativamente a isto. Na altura, a Twice já trabalhava na produção de eventos e eu sempre pensei que se algum dia viesse a fazer alguma coisa no surf seria algo diferente. É no seguimento disso que um dia surge a ideia, talvez inspirado em coisas que fui vendo e nos campeonatos que fui observando. Mas, basicamente, é de querer fazer algo diferente que o conceito do Capítulo surge. O meu foco sempre foi: a entrar e a fazer teria que ser algo de fora da caixa.

 

Ao longo dos anos a prova tem vindo a tornar-se cada vez mais internacional. Essa exigência da organização prende-se efetivamente com o quê?

A internacionalização da prova é gradual. Em 2012, quando criámos o evento, numa primeira fase, nunca nos passou pela cabeça internacionalizá-lo. O primeiro objetivo sempre foi mostrar aos sponsors, os grandes responsáveis por tudo isto, aos surfistas, ao mundo, enfim, às pessoas em geral, que realmente este era um conceito inovador que podia vingar. Isso acabou por acontecer e a partir do segundo ano, ao darmos conta da aceitação, especialmente graças à forma como montámos o evento (apoiado numa votação do público); comecei a olhar mais para fora e a pensar que o limite seria, por exemplo, fazer o evento fora de Portugal. A partir daí a equipa começou a definir algumas etapas, mas antes o evento teve que se fortalecer e afirmar em Portugal. Só a partir de 2014, digamos, é que fizemos a primeira introdução de um parceiro internacional, como a Surfline, que na altura esteve responsável pelos forecasts e garantiu uma exposição a nível mundial. Em 2015 tornou-se evidente que deveriam entrar surfistas estrangeiros e aí fizemos uma primeira abordagem com três entradas. Atualmente, em 2016, metade dos nomes da lista é preenchida com estrangeiros, provando que o evento tem muita força no exterior e que temos melhores condições para nos impormos lá fora. Por isso, a parte da internacionalização do evento passa a ser uma certeza. Depois de conquistarmos Portugal, queremos agora ganhar o mundo através de Portugal e o futuro passa por ganhar o mundo no próprio mundo. Esta opção prende-se com o crescimento, pois a própria envolvência do Capítulo, não só sob a forma de promoção de Portugal e de outros destinos, faz com que o cariz internacional tenha todo o sentido.

 

“É de querer fazer algo diferente que o conceito do Capítulo surge”

 

Este ano calhou bem com a lista final de eleitos a apresentar oito atletas estrangeiros e oito nacionais. Esse balanço perfeito vai servir de mote para as edições futuras?

Não é que tenha calhado bem. Nós já tínhamos definido que entrariam seis surfistas estrangeiros e seis surfistas portugueses, que daríamos também um wildcard estrangeiro e outro português, bem como um wildcard local. A grande coincidência foi realmente o facto do vencedor do ano passado ser estrangeiro. Um dos motes desta edição é a qualidade extrema da lista de atletas, pois, na verdade, sendo estes ou outros dezasseis os escolhidos, no final seria sempre uma lista muito forte. Mas sim, podemos dizer que este será o mote para um futuro a médio-longo prazo, até porque temos uma lista com grandes nomes, muitos deles reconhecidos mundialmente, free surfers na sua essência, sem qualquer obrigatoriedade para competirem e que procuram no Capítulo uma “montra” para se mostrarem. Isso acaba por captar muito as atenções, porque realmente tratam-se de surfistas muito especiais.

 

Continuando a pegar no aspeto internacional. A mudança para a Nazaré e a Praia do Norte é de alguma forma estratégica?

A Praia do Norte é uma praia muito internacional, talvez a mais internacional em Portugal, mas a mudança acaba por ser uma feliz coincidência. A génese do evento sempre foi poder acontecer em cinco destinos premium, ou seja, no melhor deles durante o período de espera. Logisticamente, por tudo o que evento engloba hoje em dia, tal não foi possível. Portanto, acabámos por optar por fazer dois anos em Peniche, dois anos em Carcavelos e agora fazia todo o sentido virmos para a Praia do Norte uma vez que esta seria sempre a melhor opção daquelas que ainda não tinham sido escolhidas. Nesse sentido, é uma feliz coincidência já que a Praia do Norte é neste momento a grande montra de Portugal. Para nós é um grande desafio uma vez que é uma praia conhecida pelas suas ondas gigantes onde vamos querer mostrar que também é multifacetada e que possui ondas de meio a vinte metros.

 

Que vantagens e mais-valias esperas conseguir ao realizar a prova na Praia do Norte?

Tratando-se de um beach break as ondas partem muito perto da areia, logo, ativam e incentivam o espetáculo, sempre com as pessoas muito perto da ação. A mais-valia é o desafio em si, porque para nós, enquanto organização, os desafios são mais-valias, são algo que nos acrescenta e faz superar. Esta organização está consciente que tem um desafio pela frente que, no fundo, se traduz em mostrar ao mundo que a Praia do Norte tem ondas muito boas e de performance onde os surfistas têm que possuir uma técnica elevada para conseguir dominá-las (ou, no caso do Capítulo Perfeito, entubá-las!).

 

“Os free surfers presentes no evento não têm qualquer obrigatoriedade para competirem, mas procuram no Capítulo uma montra para se mostrarem. Isso acaba por captar as atenções”

 

De todos os atletas que fazem parte da edição 2016, quem te parece estar em melhor posição para levar de vencida a prova?

A esta questão abstenho-me de responder, pois desejo continuar numa posição neutra. Contudo, parece-me que qualquer dos dezasseis surfistas pode ser campeão. Num dia de tubos qualquer surfista pode brilhar, desde que a onda certa venha ter com ele. E isso é mais espetacular, é saber que em condições tubulares os competidores ficam muito nivelados, ficam mais ou menos ao mesmo nível, e a competição fica mais engraçada e interessante de seguir, pois qualquer um pode ganhar.

 

A janela de espera já iniciou para esta quinta edição. Quais as condições para dar o call?

Nós, a organização, apontamos para ondas na casa dos 2-2,5 metros, entre os 6-8 pés. A Praia do Norte tem uma particularidade muito própria que é num dia de 2-2,5 poder entrar uma onda de 3 metros. No entanto, aquilo que definimos como condições ideais são ondas de 2 a 2,5 metros. Este é o tamanho máximo em que podemos obter mais regularidade de tubos. E isso é o que nós procuramos acima de tudo.

 

Quem gostarias de um dia ver a competir no Capítulo Perfeito?

Não sei se apanharei essa fase, mas, honestamente, gostava de ver o John John Florence, embora saiba que só poderá competir se passar a ser free surfer, coisa que não vai suceder tão cedo. Outro sonho impossível, o Kelly Slater! Para já está a competir, mas são duas pessoas que gostava de ver a competir no Capítulo Perfeito.

 

As pessoas não fazem ideia, mas organizar uma prova como o Capítulo Perfeito consome muito tempo, meios humanos e dinheiro. Podes dizer-nos, assim por alto, quantas pessoas estão envolvidas na sua realização e que valores envolve um projeto deste calibre?

Direta ou indiretamente relacionadas com o evento, entre a nossa produção, equipa de audiovisual, juízes, catering, surfistas, médicos, jetskis, etc; estão a trabalhar mais de uma centena de pessoas. Por vezes, as pessoas não têm a noção exata do projeto, que esteve sempre preparado para ter lugar num único dia. Por isso, mesmo não querendo falar em verbas, o que posso adiantar é que o Capítulo Perfeito só pode acontecer num dia. Tudo o que seja fora desses trâmites, põe em causa a sanidade financeira do evento e do projeto em si.

 

- Nas Mentawai, Rui Costa a provar que ele próprio também é um homem de tubos. Foto: Gonçalo Ruivo

 

Que tipo de dificuldades enfrenta uma organização quando se propõe levar por diante um evento deste género?

As maiores dificuldades são mesmo ao nível de sponsoring. Em termos burocráticos, autorizações de capitanias, etc; são aspetos que nos têm vindo a ser facilitados graças às parcerias e ao apoio das câmaras com quem trabalhamos. Isto é bom, porque não emperra a máquina e ajuda-nos muito. As grandes dificuldades passam realmente pelo sponsoring, em primeiro lugar, vindo depois a agenda dos surfistas e a decisão do call que é, sem dúvida, a maior responsabilidade desta organização.

 

“A partir do momento em que este [o evento] entra na minha vida, acabo por ficar muitas vezes totalmente entregue a ele”

 

E pessoalmente, quais são os principais desafios?

Eu tento simplesmente arranjar um equilíbrio entre o que dou ao evento e aquilo que ele me dá a mim. Portanto, tento criar um equilíbrio e viver com o evento, pois a partir do momento em que este entra na minha vida, nesta altura do ano, acabo muitas vezes por ficar totalmente entregue a ele. Hoje em dia, passados cinco anos, a prova requer ainda muito de mim, mas já dá para controlar a ansiedade. Em termos profissionais, ano após ano, tem sido um desafio. Eu gosto de envolver-me, especialmente na parte dos conteúdos, pensar em novidades, surfistas e novas dinâmicas. Pessoalmente, sinto que há uma preocupação muito grande que passa por inovar, por ser diferente, melhorar, apresentar algo que mantenha o público fiel, pois eu acredito que este só se tem mantido fiel porque é sempre surpreendido.

 

Última questão. Como resumirias as quatro edições já realizadas do Capítulo Perfeito e o que esperas para 2016?

Cada uma das quatro edições teve a sua história. Posso dizer que aprendemos muito com todas e que cada uma delas nos deu uma lição. Aquilo que espero para 2016 é poder usar as lições dos anos anteriores e com isso tomar as melhores decisões para este ano. Volto a referir que este é um evento que gira em torno do call. Tudo o que é falado, seja nesta entrevista ou noutros meios, tudo o que é comunicado, é sempre a respeito de um dia perfeito. Portanto, poder proporcionar e decidir qual é o melhor desses dias perfeitos é a nossa grande responsabilidade. Sabendo sempre, claro, que no final é sempre a Mãe Natureza quem manda.

 

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Entrevista: AF

 

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